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Turismo tem afetado a vida de moradores da Espanha e da Grécia Foto de Andrea Piacquadio / Pexels |
Na Espanha, o turismo representa mais de 13% do Produto Interno Bruto e vem se concentrando, em grande parte, nas regiões litorâneas do Mediterrâneo e do Atlântico. No entanto, o aumento da demanda por hospedagem impulsionou uma alta de 23% nas diárias de hotéis nos últimos três anos, com uma média de €136 por noite. Segundo a Tecnitasa, os aluguéis de temporada nas praias subiram 20,3% apenas desde meados de 2023, sendo muitas vezes totalmente reservados já no primeiro trimestre do ano. Esse cenário tem tornado inviável para muitos espanhóis frequentar as praias em família, como era tradição.
Os dados da inAtlas revelam um deslocamento do turismo doméstico: em 2024, foram 800 mil viagens a menos de espanhóis aos destinos costeiros, enquanto os estrangeiros aumentaram suas visitas em quase 2 milhões. A desigualdade também se manifesta no tempo e no padrão de consumo: turistas estrangeiros costumam permanecer o dobro do tempo nas praias e gastar quatro vezes mais do que os visitantes locais. Como resposta, o governo espanhol lançou campanhas para descentralizar os fluxos turísticos, incentivando viagens ao interior do país. A tendência já é visível: regiões como Andaluzia e Castilla y León receberam 1,7 milhão de turistas nacionais a mais, com destaque para a cidade serrana de El Bosque, que cresceu 22% em número de visitantes.
A Grécia vive situação semelhante. Com cerca de 10 milhões de habitantes, o país pode receber quatro turistas internacionais para cada dez residentes este ano. O impacto é mais visível nas ilhas populares como Rodes e Santorini. Em Rodes, a média anual chega a 117 pernoites de turistas por morador. As tarifas de hospedagem nas ilhas variam entre €1.000 e €2.000 por semana para dois hóspedes, podendo chegar a €4.000 em Santorini.
Para a população local, esse encarecimento torna as férias praticamente inacessíveis. De acordo com o Eurostat, 46% dos gregos não têm condições de tirar uma semana de férias por ano – a segunda maior taxa da União Europeia, atrás apenas da Romênia. Dados do IELKA mostram que apenas 10% das famílias gregas conseguem se hospedar em hotéis ou pousadas, e mais da metade decidiu não viajar em 2025. A maioria opta por estadias curtas em casa de parentes ou reduz drasticamente o orçamento.
A situação é agravada pelas consequências ainda sentidas da crise financeira que atingiu o país na última década. A renda bruta média em 2025 é de €1.415, mas metade dos trabalhadores da iniciativa privada ganha menos de €1.000 por mês. Ao mesmo tempo, os preços praticados no setor de turismo seguem padrões internacionais, criando um descompasso entre o poder de compra local e o custo real de viagens. Exemplo disso é o valor de uma balsa entre Piraeus e Syros para uma família com carro: €488, o triplo de uma viagem semelhante entre Barcelona e Ibiza.
O turismo segue sendo essencial para as economias de Espanha e Grécia, mas o atual modelo coloca em risco o acesso dos cidadãos locais a seus próprios patrimônios naturais e culturais. Para especialistas como Juan Pedro Aznar, da Esade Business School, esse fenômeno revela um “efeito de deslocamento” que afasta os residentes dos principais destinos. A solução passa por políticas públicas que promovam a redistribuição territorial do turismo, regulem os aluguéis de temporada e ampliem o acesso equitativo às experiências turísticas. O desafio está em manter o protagonismo internacional sem perder o equilíbrio social.
Redação